A Santa Igreja Católica reconheceu sempre a São Jerônimo como um homem eleito por Deus para explicar e fazer entender melhor a Bíblia Sagrada, por isso foi declarado Patrono de todos os que no mundo se dedicam a fazer entender e amar mais a Palavra de Deus gravadas nas Escrituras Sagradas.
"E as portas do inferno não prevalecerão contra Ela"! Nas eras conturbadas para a Igreja é que aparecem os grandes guias. O período situado entre o final do século IV e meados do século V foi uma dessas eras. Erros e heresias pululavam no seio da Cristandade. Então, surgiram grandes luzeiros de santidade e ciência: Santo Hilário, de Poitiers, Santo Ambrósio, de Milão, o grande Santo Agostinho. Havia ainda um outro luminar que, com os anteriores, formou o conjunto dos "Santos Padres da Igreja": São Jerônimo, cuja festa celebra-se no dia 30 de setembro, o "mês da Bíblia".
Jerônimo de Stridon
Jeronimo nasceu no ano de 342. Era filho de Eusébio, da cidade de Stridon, já na divisa entre a Panomia e a Dalmácia, em terras não distantes de Aquileia, na Itália. Sua família era cristã, nobre e rica. Acompanhando o costume da época, foi batizado apenas aos 18 anos, contudo, teve uma educação cristã desde criança.
Seu pai percebeu logo as precoces aptidões que Jerônimo tinha para os estudos e apenas esperou que ele chegasse à adolescência para enviá-lo a estudar em Roma. Ali usando a pequena fortuna que seu pai lhe deu, procurou os melhores mestres. Tendo, porém, uma juventude um tanto livre.
No centro do mundo civilizado de então, o jovem dedicou-se com afinco aos estudos da gramática, da retórica e da filosofia. Estudou latim tendo como professor de línguas um famoso pagão chamado Donato.
Jerônimo tornou-se um grande latinista, sendo também muito bom conhecedor do grego e de outros idiomas mais.
Jerônimo e os clássicos romanos e gregos
Ele dedicava horas e horas de seus dias lendo, estudando e até decorando livros de grandes autores latinos: Cícero, Virgílio, Horácio, Tácito, E ainda encontrava disposição para conhecer autores gregos. Entre eles Homero e Platão. Tal era seu entusiasmo e admiração pelos escritores clássicos que logo formou uma biblioteca só com obras deles, chegando até a copiar a mão vários desses livros.
Dedicando tanto tempo a esses autores, quase nunca encontrava ocasião para as leituras cristãs. Totalmente posto nessa situação nada conveniente, ele, contudo, não tinha rompido com os princípios que conhecera na infância, não havia, de todo, cortado os laços com suas raízes cristãs.
Foi, certamente, sua inexperiência juvenil que o levou a mergulhar sem censuras no ambiente mundano e decadente da Roma de seu tempo. Mais que um extraviado exacerbado, ele foi uma vítima do modismo da época.
Tempos mais tarde, Jerônimo admitiu que essa sua atitude o tinha colocado fora do verdadeiro caminho. Apesar disso ele recordava também que Deus não o havia abandonado nunca e que o guiava constantemente. Foi por essa ocasião que ele tornou-se catecúmeno. Continuava seus estudos e preparava-se para ser batizado. Seus domingos em Roma consistiam em constantes visitas às catacumbas. Ali ele meditava sobre a fé dos mártires, admirava a atitude deles e venerava suas relíquias.
Jerônimo batizado
Jerônimo recebeu o santo batismo na idade adulta. Ele foi batizado pelo Papa Libério. Já como cristão batizado, ele fez uma viagem de estudos pelas Gálias. Para acompanhá-lo levou consigo seu irmão de leite Bonoso.
Nessa viagem, em Treveris, ele decidiu entregar-se ao serviço de Deus e, depois de conhecer ali uma das mais afamadas academias que existiam no Ocidente, ele continuou sua viagem. Foi primeiramente para a Grécia, depois visitou parte do Oriente Médio. Ali, numa região desértica perto de Antioquia, viveu alguns anos em plena solidão.
Por essa ocasião, ele já tinha começado a dirigir seus estudos para outros pontos do saber humano, fora dos clássicos. Então, ele aproveitou seu tempo para estudar hebreu com um judeu convertido. Sua intenção era poder estudar as Sagradas Escrituras em seu idioma original. Isso não foi fácil: só o fim a que agora destinava seus estudos e o seu constante desejo de conhecimento lhe mantiveram nesse intento.
Ele chega a afirmar que "As fadigas que isto me causou e os esforços que me custaram, só Deus sabe. Quantas vezes desanimei e quantas voltei atrás e tornei a começar pelo desejo de saber; sei-o eu que passei por isso, e sabem-no também os que viviam na minha companhia. Agora dou graças ao Senhor, pois que colho os saborosos frutos das raízes amargas dos estudos" (Pe. José Leite, Santos de Cada Dia, Editorial Apostolado da Oração, Braga, 1987, vol. III, p. 104. )
Jerônimo: tentações e consolo
Nesse período, as dificuldades e cansaços que estes estudos lhe traziam não eram todo o sofrimento pelo qual ele teve que passar. Para ele, foi necessário enfrentar um inimigo mais sutil, inteligente e mau.
Deus permitiu que o demônio o torturasse. A cada instante o maligno o assaltava com tentações e desejos imundos contra o sexto mandamento. Para combatê-los, Jerônimo entregava-se à oração e à penitência. Eram jejuns que, às vezes, duravam semanas inteiras. Mas Deus não o abandonava!
Em meio às tentações, o Senhor o consolava: "depois de chorar muito e contemplar o céu, sucedia-me, por vezes, ser introduzido dentro dos coros dos anjos. Louco de alegria, eu cantava... (Pe. José Leite, Santos de Cada Dia, Editorial Apostolado da Oração, Braga, 1987, vol. III, p. 105)
Cristão, não: Ciceroniano!
Jerônimo quis visitar Jerusalém. Queria caminhar pela Terra Santa, venerar os lugares que foram santificados pela presença de Nosso Senhor. Aproveitou a ocasião de sua estada em Jerusalém para aprofundar seus conhecimentos da língua hebraica, ele desejava ter um meio a mais para conhecer melhor as Sagradas Escrituras. Assim, poderia ter mais segurança nas respostas às questões que o Papa São Dâmaso lhe fazia constantemente a respeito de passagens difíceis dos Livros Sagrados.
No entanto, ler a Sagrada Escritura não lhe trazia prazer. Para Jerônimo, o texto bíblico era simples demais e não tinha ornato... Ele tinha sido formado na leitura dos clássicos latinos e gregos e se acostumara com a "eloquência" e "elegância" da literatura de estilo pagão. Ele sentia muita aridez na leitura da Bíblia. Apesar de ser um sábio para o mundo, um conhecedor com ampla visão das ciências de então, continuava cego para as coisas mais elevadas, as coisas divinas.
Para que ele mudasse de vida, foi necessário que o próprio Deus chamasse sua atenção. Jerônimo, anos mais tarde, contou em carta a uma de suas discípulas, Santa Eustóquia, o que foi que se passou com ele:
Era o ano 374, ele estava na Antiópia e fazia austeras penitencias. Estando em oração, Jerônimo teve uma visão. Ele tinha sido arrebatado aos céus, e se via diante do Juízo de Deus. O próprio Nosso Senhor Jesus Cristo presidia o Tribunal e perguntava sobre seu estado de alma e sua Fé.
- Sou cristão. Responde Jerônimo. Ao que o Juiz lhe replicou com severidade:
- Mentira!... Você não é cristão, mas ciceroniano...
Isso seria o mesmo que dizer: "Não sois de Cristo, sois de Cícero."
O Juiz mandou que ele fosse açoitado. Os assistentes pediram clemência argumentando que ele ainda era jovem e poderia corrigir-se, arrepender-se e salvar-se. Diante do que lhe acontecia, Jerônimo reconheceu o estado de alma em que se encontrava e nessa situação tomou a única atitude que lhe seria conveniente: reconheceu seu erro, pediu perdão.
É certo que ele percebeu que tinha sido perdoado, então, naquele instante, ele fez o firme propósito de emendar-se, saindo do arrebatamento cheio de compunção e muito arrependido e pleno do amor de Deus.
"Desde aquela hora eu me entreguei com tanta diligência e atenção a ler as coisas divinas, como jamais havia tido nas humanas", conclui o Santo em sua carta a Santa Eustáquia. (Pe. Ribadaneira, in La Leyenda de Oro, op. cit., p. 644)
Jerônimo convive com Santos
Ele foi, então, para Chalcis, no deserto da Síria e lá passou quatro anos. Tinha uma vida de monge e aproveitou o tempo para aprofundar seus conhecimentos de hebreu e estudar os escritos de São Paulo de Tebas. Jerônimo deixou o ambiente monacal e dirigiu-se a Constantinopla. Ele queria ver e ouvir São Gregório Nanzianzeno. Devido a sua oratória e erudição, esse Santo era conhecido como sendo "o Teólogo".
Durante três anos ele ali permaneceu estudando com São Gregório. Foi ele quem lhe abriu o espírito ao amor pela exegese das Sagradas Escrituras. Foi nessa ocasião também que Jerônimo teve oportunidade de fazer uma grande e profunda amizade com dois outros luzeiros que brilhavam na Igreja do Oriente: São Basílio e seu irmão São Gregório de Nissa.
Jerônimo Sacerdote
Ele esteve algum tempo também na Antioquia da Síria. Ali prestou serviços ao Bispo Paulino que o incentivou a receber o sacramento da Ordem.
Estava com mais de trinta anos quando tornou-se sacerdote. Ele obteve condições especiais de vida sacerdotal. Poderia continuar sua vida como monge e não estar sujeito à jurisdição de nenhuma diocese. Quase nunca exerceu o ministério sacerdotal. Tornou-se um monge para quem o isolamento monacal seria ocasião para dedicação total ao estudo, à reflexão, à oração, tendo em vista a difusão do cristianismo.
Ele pôde nessa ocasião, com muita dificuldade, estudar hebraico e aperfeiçoar seus conhecimentos do grego tendo em vista poder compreender melhor as escrituras em suas línguas originais.
Jerônimo pensou em ir para o deserto a fim de penitenciar-se de seus pecados. Ele pensava especialmente sacrificar-se para afastar de si as fortes tendências e os grandes desejos que o impeliam para a sensualidade. Naquele lugar de silencio e isolamento ele rezava. Jejuava muito e passava noites sem dormir, em oração e sacrifícios. Ali, porém, ele não encontrou a paz. Deus reservava para ele o encontro com uma descoberta: sua missão não era viver na solidão. Jerônimo voltou para Roma.
Jerônimo secretário do Papa
Por causa do modo de ser e da mentalidade dos povos orientais, na Igreja do Oriente havia vários ambientes onde os erros doutrinários encontravam terreno propício para germinarem. As heresias se difundiam e causavam confusão em todo o corpo social.
Era tal a situação que tornou-se necessária uma reação da autoridade espiritual e da temporal. Elas tinham que se unir para defender-se dos erros que ali pululavam. Para isso o Imperador Teodósio e o Papa São Dâmaso resolveram convocar um sínodo em Roma.
O secretário do evento deveria ser Santo Ambrósio, porém, o culto e famoso bispo de Milão adoeceu gravemente. Para substituí-lo, o Papa convidou Jerônimo. Ele desempenhou esse cargo com muita eficiência e sabedoria. Reconhecendo em São Jerônimo seus dotes extraordinários e seu grande saber, o Papa São Dâmaso quis tê-lo junto de si e o nomeou como seu secretário, assim que terminou o sínodo.
Como secretário Jerônimo tornou-se o encarregado de redigir as cartas enviadas pelo Pontífice. Era dele uma outra atribuição muito importante dentro do governo da Igreja: "responder a todas as questões que se referissem à religião, de esclarecer as dificuldades das Igrejas particulares [dioceses], das assembléias sinodais, de prescrever àqueles que voltavam das heresias o que eles deveriam crer ou não, e de estabelecer, para isso, regras e fórmulas" (Les Petits Bollandistes, Vies des Saints, d'après le Père Giry, par Mgr. Paul Guérin, Bloud et Barral, Libraires-Éditeurs, Paris, 1882, tomo XI, p. 565)
Jerônimo e as Escrituras Sagradas
O Papa desejava ter uma tradução da Bíblia que fosse o mais fiel possível aos textos originais.
Os textos bíblicos até então existentes tinham imperfeições de linguagem e imprecisões de traduções. O Papa percebia a necessidade de uma tradução que pudesse servir de texto único e uniforme para servir de base para na liturgia, nos estudos e orações dos fiéis, já que as versões populares eram imperfeitas e passiveis de criar confusão entre os fiéis.
Foi então que o Papa São Dâmaso encarregou São Jerônimo de verter o texto das Escrituras Sagradas para o latim. O Papa sabia que seu secretário teria condições para levar a cabo esse importante projeto. Ele já tinha provas do profundo conhecimento que Jerônimo tinha dos textos bíblicos. Sua fama de latinista erudito e poliglota consumado era sabida por todos. Além do latim, ele conhecia bem o grego e o hebraico, e ainda entendia bem o aramaico; línguas muito ligadas aos textos Sagrados.
O trabalho de São Jerônimo abrangeu praticamente sua vida toda. Ele escrevia com elegância clássica o latim e traduziu a Bíblia inteira. Daí foi que surgiu a texto da Bíblia conhecido como "Vulgata", que significa "de uso comum". Essa tradução foi usada largamente em quase quinze séculos. Seu texto tornou-se oficial com o Concílio de Trento e só cedeu o lugar nos últimos tempos, depois de estudos linguísticos exegéticos mais recentes.
No trabalho deixado por São Jerônimo, ele mostra seu agudo senso crítico, um amor extraordinário à Palavra de Deus e uma grande riqueza de informações sobre tempos, usos e lugares relativos à Bíblia Sagrada. O Papa Clemente VIII afirmou que São Jerônimo, nesse trabalho de suma importância, foi assistido e inspirado pelo Espírito Santo.
A dedicação extraordinária que São Jerônimo teve na tradução das Escrituras Sagradas só pode ter, de fato, um motivo de origem sobrenatural. E é o que se confirma ao ver as explicações que ele mesmo deu ao justificar seu empenho nesse importantíssimo trabalho: "Cumpro o meu dever, obedecendo aos preceitos de Cristo que diz: ‘Examinai as Escrituras e procurai e encontrareis' para que não tenhais de ouvir o que foi dito aos judeus: ‘Estais enganados, porque não conheceis as Escrituras nem o poder de Deus'. Se, de fato, como diz o Apóstolo Paulo, Cristo é o poder de Deus e a sabedoria de Deus, aquele que não conhece as Escrituras não conhece o poder de Deus nem a sua sabedoria. Ignorar as Escrituras é ignorar Cristo". (Pe. José Leite, op. Cit., p. 106.)
Jerônimo perseguido em Roma
Até a morte de São Dâmaso, em 384, Jerônimo permaneceu em Roma. "Todos acorriam a ele, e cada qual procurava ganhar-lhe a vontade: uns louvavam sua santidade, outros a doutrina, outros sua doçura e trato suave e benigno, e finalmente todos tinham postos os olhos nele como em um espelho de toda virtude, de penitência, e oráculo de sabedoria" .(Pe. Ribadaneira, op. cit. p. 645.)
Em Roma, criou-se em torno de Jerônimo amplo círculo de amizades, sobretudo de matronas da alta sociedade que o ajudavam com seus recursos para custear seus trabalhos e que lhe orientava nos ásperos caminhos da santidade de cunho monástico.
Porém, os altos cargos que exercia, a dureza com a qual tinha que corrigir os defeitos existentes no seio da alta classe social lhe trouxeram também todo tipo de invejas. Em Roma, onde não aceitavam seu modo enérgico de correção, Jerônimo sentia-se incompreendido e caluniado. Após a morte do Papa São Damaso, os inimigos de São Jerônimo iniciaram uma verdadeira campanha de difamação e perseguição contra ele.
Jerônimo troca Roma por Belém
Tal era o ambiente que se criou em Roma contra Jerônimo que ele decidiu afastar-se da Cidade Eterna indo, definitivamente, para a Terra Santa. Estabeleceu-se em Belém onde ficou com Santo Eustáquio, Santa Paula e sua filha Eudóxia e outros mais seguidores pregando na Palestina e no Egito.
Várias das ricas senhoras romanas que haviam se convertido através de seus ensinamentos e conselhos o acompanharam e foram morar junto à Gruta do Presépio, sob sua orientação espiritual Fundaram, sob a direção do Santo, um mosteiro masculino e um feminino, este dirigido por Santa Paula. Estas senhoras haviam vendido tudo que tinham em Roma. Com o dinheiro obtido ajudaram São Jerônimo na construção de um convento para homens e três para mulheres, além de construir uma casa para atender peregrinos que chegavam de todas as partes do mundo para visitar o lugar onde havia nascido Jesus.
São Jerônimo, porém, levava vida como monge de penitencias rígidas. Seus últimos 35 anos ele os passou em uma grande cova, próxima à Gruta do Presépio. Ali continuou, até a morte, seus estudos e trabalhos bíblicos e com muita energia ainda escrevia contra os herege que se atreviam a negar as verdades da Santa Igreja Católica, entre eles Helvídio e Joviano.
São Jerônimo e Santo Agostinho
Houve um princípio de polêmica entre os dois grandes Doutores da Igreja, Santo Agostinho e São Jerônimo. Tudo porém foi explicado: tratava-se de um mal-entendido entre esses dois luminares do cristianismo. Tudo foi explicado, as coisas se puseram em seu devido lugar e uma amizade que nunca havia se rompido, continuou cheia de respeito. Eles continuaram unidos até a morte, melhor seria dizer até no Céu.
São Jerônimo dizia que Santo Agostinho era "seu filho em idade, e seu pai em dignidade", uma vez que era Bispo. Por seu lado, o Bispo de Hipona escreveu-lhe: "Li dois escritos vossos que me caíram nas mãos, e achei-os tão ricos e plenos que não quereria, para aproveitar em meus estudos, senão poder estar sempre a vosso lado". (7 - Edelvives, El Santo de Cada Día, Editorial Luis Vives, S.A., Saragoça, 1955, tomo V, p. 307.)
No dia 30 do mês de setembro do ano 420, falece São Jerônimo. Estava avançado em idade e crescido em virtude faleceu. No mesmo dia, em visão, ele aparecia a Santo Agostinho e descrevia como era o estado das almas bem-aventuradas no Céu...
O Leão de São Jerônimo
Numa certa tarde, como faziam todos os dias nas horas canônicas, os monges estavam reunidos ouvindo as lições do dia durante. São Jerônimo estava entre eles e ouvia atento. De repente, todos perceberam que um leão se aproximava. Foi uma correria geral. São Jerônimo manteve a calma: foi o único. Ele levantou-se e foi encontrar-se com aquele hospede não convidado...
Era um animal enorme que usava somente três patas para caminhar. A quarta pata ele a trazia levantada. Claro que o leão não poderia falar, mas dava a impressão de querer comunicar alguma coisa e ofereceu a Jerônimo a pata que trazia levantada. O monge a examinou e percebeu que o animal estava gravemente ferido.
Jerônimo chamou o menos medroso dos monges para ajudá-lo a limpar e cuidar do ferimento que estava em carne viva, infeccionado e ainda cheio de espinhos. Jerônimo tratou do animal, retirou-lhe os espinhos e o medicou com unguentos. O animal sarou.
Os cuidados oferecidos ao animal amansaram a "besta fera". O leão passou, então a caminhar pacificamente pelo mosteiro. Onde estivesse São Jerônimo, junto estava o animal que se comportava como um animal doméstico.
Jerônimo mostrou aos monges uma primeira lição do episódio: "Pensem sobre isto e vocês poderão encontrar lições de vida. Eu creio que não foi tanto para a cura de sua pata que Deus o enviou até nós, pois, o leão se curaria sem a nossa ajuda. Deus nos enviou esse leão para mostrar quanto a Providencia estava ansiosa para nos prover do que necessitamos para nosso bem."
O jumento foi roubado ou comido pelo Leão?
Os monges sugeriram então que o leão fosse usado para acompanhar e proteger o jumento que carregava a lenha para o mosteiro. E, por muito tempo, assim foi: o leão guardava o jumento enquanto este trabalhava.
Um dia, porém, o leão dormiu enquanto o jumento pastava e alguns mercadores que por ali passavam roubaram o jumento. O leão acordou e passou a procurar o jumento. Procurou todo o dia, sem encontrá-lo. Voltou para o mosteiro e ficou diante do portão. Parecia ter consciência de sua culpa: não tinha mais o andar imponente que parecia quando andava ao lado do burrico.
Alguns monges concluíram que o leão tinha comido o jumento. E se recusaram a alimentá-lo, enviando de volta para comece o resto de sua vítima. Será que havia sido o leão que dera cabo do jumento? Jerônimo mandou que procurassem a carcaça do jumento. Eles não encontraram nada e não viram sinais de violência.
Ao saber disso São Jerônimo disse: " Eu fico triste com a perda do asno, mas não façam isto com o leão. Tratem dele como antes, deem comida para ele. Ele fará o serviço do jumento: deverá trazer em seu lombo a lenha que necessitamos." E assim aconteceu.
Um Leão que cumpre a vontade de Deus
O leão regularmente fazia a sua tarefa, mas continuava a procurar o seu velho companheiro. Um dia do alto de uma colina e viu na estrada homens montados em camelos e um deles montando um jumento.
O leão foi ao encontro a eles. Aproximando-se, reconheceu o seu amigo e começou a rugir. Os mercadores assustados correram deixando para trás o jumento, os camelos e a carga que traziam. Como faria um cão pastor, o leão conduziu os animais para o mosteiro.
Quando os monges viram aquele desfile inusitada correram até São Jerônimo. E foi até os portões e os abriu dizendo: "Tirem a carga dos camelos e do jumento, lavem suas patas e deem comida para eles. Esperemos para ver o que Deus queria mostrar a este seu servo quando nos deu o leão".
Confie na sua Ovelha
Os monges seguiram as instruções de Jerônimo. O leão começou a rugir de novo e a balançar sua cauda, alegremente. Pesarosos por causa do que pensaram sobre o Leão, relembraram um pensamento conhecido na região: "Irmão, confie na sua ovelha, mesmo que se por um tempo ela pareça um ganancioso rufião. Deus fará um milagre para curar o seu caráter".
Jerônimo, sabendo o que iria acontecer disse: "Meus irmãos, preparem boa água, refrescos e frutas pois, chegarão novos hóspedes que deverão ser bem tratados'. Tudo aconteceu como o Santo pediu. E logo um grupo de mercadores estava diante do portão. Embora tivessem sido bem recebidos pelos monges, correram até São Jerônimo e prostraram-se a seus pés, pedindo perdão e agradecendo o acolhimento.
Jerônimo ainda disse aos monges: "deem os refrescos a eles e deixem partir com os seu camelos e suas cargas". Através do Leão, Deus supre as necessidades do mosteiro.
Os mercadores, como retribuição e gratidão, ofereceram metade do óleo que os seus camelos carregavam para que fosse usado nas lâmpadas do mosteiro e ainda deixaram alimentos para os monges. Então, o chefe dos mercadores ainda disse: "Nós daremos todo óleo que vocês precisarem durante todo ano e nossos filhos e netos serão instruídos de também seguirem esta ordem: nada de sua propriedade será jamais tocada por qualquer de nós ".
São Jerônimo aceitou a oferta e os mercadores de sua parte aceitaram os refrescos e partiram com a benção do Santo, voltaram alegres para o seu povo.
São Jerônimo, tirando uma lição de toda essa história, respondeu a pergunta que ele mesmo havia feito anteriormente: "vejam meus irmãos o que Deus tinha em mente quando nos mandou o seu leão"!
Esta narração foi adaptada por nós. Ela procura dar uma breve explicação do porque a iconografia costuma apresentar São Jerônimo com um leão junto dele.
No livro "Vita Divi Hieronymi" (Migne. P.L., XXII, c. 209ff.) traduzido para o Inglês por Helen Waddell em "Beasts and Saints" (NY: Henry Holtand Co., 1934), é onde podemos encontrar essa narração por inteiro. (JSG)
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