Uma jovem bela, cheia de vida, atleta, ativa. Uma jovem normal, uma cristã. Depois, inesperadamente a doença, a agonia, a morte. Uma escalada rápida para o Céu.
Encaminhado o processo da sua beatificação.
Parecia
apenas mais uma entre tantos jovens do Movimento dos Focolares, os
"Gen" (Geração Nova). Como vários deles, morreu cedo. Nela percebemos
uma certa predileção de Deus. Lemos alguns escritos seus e soubemos do
funeral, que foi definido uma "festa de núpcias". Tínhamos rezado por
ela e por sua família.
Mas,
seus gestos e palavras voltam regularmente à tona, graças à divulgação
feita pelos seus amigos e pelo seu bispo, e graças a seus escritos, sua
biografia e um vídeo amador sobre sua história. O fato é que a vida de
Chiara Luce Badano continua contagiando milhares de pessoas. Como
escreve o Abbé Pierre:"Os santos não estão limitados a um catálogo, e nós, certamente, cruzamos com eles todos os dias". Chiara Badano era uma destes santos da normalidade.
O nascimento tão esperado
Chiara
Badano nasce em 29 de outubro de 1971, em Sassello, cidadezinha
graciosa no noroeste da Itália, primeira e única filha de Ruggero
Badano, caminhoneiro, e Maria Teresa Caviglia, operária, casados há 11
anos. É fácil imaginar a enorme felicidade provocada por esse
nascimento. "Mesmo com esta alegria
imensa, compreendemos logo – conta a mãe – que ela não era somente nossa
filha, mas que era, antes de tudo, filha de Deus".
A infância transcorre tranqüila. Porém com uma nota de serenidade
incomum. A mãe deixa o trabalho para cuidar da filha. Diálogo e afeto se
misturam com momentos em que se deve dizer "não" aos caprichos de
Chiara que, querendo ou não, corre o risco de crescer mimada. "Tínhamos
consciência desse risco! Por isso, desde os primeiros anos, queríamos
deixar as coisas bem claras. Não perdíamos a oportunidade de ajudá-la a
fazer as coisas diante de Deus", diz a mãe.
Algo muito importante
Maria Teresa conta um episódio:"Uma
tarde ela chega em casa com uma linda maçã vermelha. Questionada,
Chiara responde que pegou a fruta no quintal da vizinha. Explico-lhe que
ela deve pedir antes de pegar e que, por isso, deve devolver a maçã,
pedindo desculpas à vizinha. Mas ela fica acanhada e não quer ir.
Insisto: é muito melhor dizer a verdade do que comer uma boa maçã.
Então, Chiara procura aquela senhora e lhe explica tudo. À noite, nossa
vizinha traz uma cesta de maçãs para Chiara, justificando: "Hoje ela
aprendeu algo muito importante".
Aquele encontro aos nove anos
Chiara
manifesta muito cedo um caráter generoso. Numa tarefa, quando estava no
primeiro ano da escola, escrevendo ao Menino Jesus, não lhe pede
brinquedos, mas:"Ajude a vovò Gilda a sarar e todas as pessoas que não estão bem". É
conciliadora, embora saiba defender suas idéias e discutir com os pais.
Mas esse "rompimento" dura apenas alguns minutos. Uma recordação
daquele período: a mãe lhe pede que lave a louça."Não,
não quero", responde ela. E vai para o quarto. Logo depois volta e
diz:"Como é aquela história do Evangelho, dos dois operários que devem
ir à vinha, e um diz que sim, mas não vai, e o outro diz que não, mas
vai? Mamãe, me dê o avental". E lava a louça.
Fatos
como estes atestam a educação cristã sólida que recebe, graças também à
comunidade paroquial, ao pároco que lhe dá aulas fascinantes de
catecismo, e também às amizades que Chiara constrói. Tem um fraco pelas
pessoas idosas, e procura ajudá-las.
Aos
nove anos participa de um encontro das Gen 3 (crianças e adolescentes
dos Focolares) e conhece o ideal da unidade. Um ano depois, em 1981,
seus pais participam do Familyfest, um grande encontro para famílias
promovido pelo Movimento. Sua mãe conta: "Voltando
para casa, dizíamos que se tivéssemos que responder quando tínhamos
casado, responderíamos: quando encontramos este Ideal". Desde aquele momento, a família Badano será um exemplo de respeito, calor e unidade.
No seu diário, Chiara escreve alguns fatos simples sobre o seu esforço de construir a unidade. Por exemplo:"Uma
amiga está com catapora e todos têm medo de visitá-la. Com o
consentimento dos meus pais, eu levo todo dia os deveres de casa para
que ela não se sinta sozinha".
Esporte, afetos e... uma viagem decisiva
Santo
Agostinho repetia muito que "o amor nos torna belos". Chiara é, de
fato, revestida da beleza evangélica, mesmo se naturalmente já é uma
jovem bela. Chiara é uma menina cheia de energia e tem um caráter bem
definido. Mas, nas suas fotos o que mais atrai é o seu olhar, nem
retraído nem agressivo. Apenas límpido.
A
adolescência transcorre na normalidade mais absoluta. Em 1985, vai com a
sua família para outra cidade a fim de cursar o ginásio. Apesar do
empenho, é reprovada na oitava série. Isso a faz sofrer muito.
Com
os pais surgem alguns desentendimentos, por exemplo quanto ao horário
de voltar para casa. Chiara gosta muito de sair à noite com os amigos,
sobretudo nos fins de semana. Mas, o afeto familiar é mais forte e
chegam a um entendimento.
Chicca Coriasco, grande amiga e confidente, diz: "Ela
tinha um grande preparo humano. Gostava de vestir-se bem, de pentear-se
com cuidado, e às vezes, de se maquiar, mas sempre de forma discreta".
Está sempre rodeada de amigos e amigas.
É uma grande atleta:
tênis, natação, escaladas nas montanhas.
Não consegue ficar parada.
Gosta muito de dançar e cantar.
Muitos rapazes se interessam por ela, mas ela é uma sonhadora. Algumas vezes, olhando para um ou outro, diz à amiga: "Aquele me agrada". Nada além disso.
Verão
de 1988. Pouco depois de saber que tinha sido reprovada em matemática,
acompanha um grupo de crianças, as Gen 4, a um congresso em Roma. Sente o
coração apertado por ter sido reprovada, mas não dá sinais de tristeza.
Escreve aos pais: "Chegou um momento
muito importante: o encontro com Jesus Abandonado. Abraçá-lo não foi
fácil; mas esta manhã Chiara Lubich explicou às Gen 4 que ele deve ser o
esposo delas".
Chiara
Badano mantém com Chiara Lubich, fundadora do Movimento dos Focolares,
uma densa correspondência, ma, sobretudo, um relacionamento intenso e
vital até o fim, quando dirá: "Devo tudo a Deus e a Chiara". Quando
lhe pediu um "nome novo", um programa de vida, a resposta foi "Chiara
Luce", 'Clara Luz'. Era para lembrar que sua vida deveria ser expressão
da luz de Deus .
O diagnóstico imprevisível
Um fato imprevisível. Ao jogar tênis, Chiara sente uma forte dor no ombro. De início, nem ela nem os médicos dão grande importância. Mas as dores continuam e ela precisa fazer exames mais aprofundados. O diagnóstico: sarcoma osteogênico com metástase, um dos tipos mais graves e dolorosos de tumor. Depois de um longo silêncio, sem choro nem rebelião, Chiara acolhe a notícia com coragem: "Eu vou suportar. Sou jovem", diz. Seu pai comenta, depois: "Tínhamos a certeza de que Jesus estava em nosso meio. Ele nos dava forças". Começa uma profunda transformação, uma rápida escalada à santidade.
Os
tratamentos iniciam e o altruísmo de Chiara chama a atenção.
Descuidando-se do repouso, sai da cama e, apesar da dor intensa
provocada pela grande calosidade óssea nas costas, se dedica a uma jovem
toxicodependente deprimida, acompanhando-a por toda parte: "Depois eu encontro um tempo para dormir", afirmava ela.
O
filósofo Cioran se perguntava: "Já se viu um santo alegre?". Chiara
Luce é assim, porque Jesus se torna sempre mais o seu "esposo". Escreve: "Jesus me mandou esta doença no momento certo".
É
internada num hospital em Turim. Um gen disse: "No início íamos
visitá-la para lhe dar força, mas logo vimos que não podíamos mais nos
separar dela. Ela nos atraía como um ímã".
A doença se desenvolve de forma impiedosa, mas Chiara procura ter uma vida normal e alegre.
E um dos médicos, Antonio Delogu: "Chiara demonstra com seu sorriso, com seus grandes olhos luminosos, que a morte não existe; existe somente a vida".
Nos meses seguintes, Chiara enfrenta duas dolorosas operações. A
quimioterapia causa a queda dos cabelos, o que a faz sofrer bastante. A
cada cacho de cabelo que perde, repete um simples mas intenso: "Por ti,
Jesus". Os pais, sempre presentes, lembram a ela que sob aqueles
sofrimentos existe um misterioso desígnio de Deus.
A um amigo, que partia para uma missão humanitária na África, ela doa todo o dinheiro que havia economizado, dizendo: "Para mim não serve, eu tenho tudo".
Nada de morfina. "Por mais um pouco de tempo, quero dividir a cruz com Ele"
Chiara narra como enfrentou uma dolorosa biópsia: "Quando
os médicos começaram a fazer a cirurgia - pequena mas muito incômoda -,
chegou uma pessoa, uma senhora, com um sorriso muito luminoso; era
linda. Aproximou-se de mim, segurou minha mão e infundiu coragem ao meu
coração. Do mesmo modo que chegou, também desapareceu: não a vi mais.
Fui invadida por uma alegria imensa, e o medo que eu sentia desapareceu.
Naquela ocasião entendi que, se estivéssemos sempre prontos a tudo,
Deus nos mandaria muitos sinais".
Aos poucos, Chiara perde os movimentos das pernas. Afirma: "Se eu tivesse que escolher entre caminhar ou ir para o paraíso, escolheria essa última possibilidade".
Não há mais esperança de cura. Chega o momento da provação, que é
intensa. Mas ela não se rende, ajudada também por Chiara Lubich, que lhe
escreve: "Deus tem um amor imenso por você e quer penetrar no íntimo da
sua alma e fazer com que você experimente gotas de céu". Apesar das
dores intensas, recusa a morfina para se manter consciente de seus atos e
explica: "Não quero perder a lucidez, porque a única coisa que posso
fazer é oferecer a dor a Jesus. Quero compartilhar com ele, ainda por um
pouco, a sua cruz".
Chiara
Luce já se comporta como uma pessoa espiritualmente madura. Um médico,
Fabio De Marzi, lhe escreve: "Não estou acostumado a ver jovens como
você. Sempre encarei a sua idade como o tempo das grandes emoções, das
alegrias intensas, dos grandes entusiasmos. Você me ensinou que esta é,
também, a idade de uma maturidade absoluta".
Aquele luz no olhar, de onde vem?
19 de julho de 1989. Chiara enfrenta uma forte hemorragia e quase
morre. Nesta ocasião diz: "Não derramem lágrimas por mim. Eu vou para
Jesus. No meu funeral não quero pessoas que chorem, mas que cantem
forte»".
Durante a aplicação do soro na veia, Chiara comenta: "O que é esta gota que cai, em comparação com os pregos nas mãos de Jesus?". E acompanha cada gota com um: "por ti, Jesus". Recebe a visita de um cardeal que lhe pergunta: "De onde vem essa luz maravilhosa que você tem nos olhos?". E ela responde: "Procuro amar muito Jesus".
Algumas
vezes acontece algo incomum -, ela pede que os pais não deixem os
amigos entrarem em seu quarto. Certo dia explica sua atitude: "Não
era sinal de tristeza ou de falta de afeto. Pelo contrário. Eu agia
assim porque tinha dificuldade de descer do ponto no qual habitava (com
Deus), para depois subir outra vez". Todos os que estavam próximos dela
experimentavam uma "atmosfera de paraíso". Escreve aos amigos: "Um outro
mundo me esperava e eu não podia fazer outra coisa senão abandonar-me.
Mas agora me sinto envolvida por um esplêndido desígnio que pouco a
pouco me é revelado".
A festa de núpcias
Num
de seus últimos dias ela diz: "Não peço mais a Jesus que ele venha me
buscar para me levar ao paraíso; não quero lhe dar a impressão de que
não quero mais sofrer". Não pede mais a saúde, mas a capacidade de fazer
a vontade de Deus. Consciente de sua situação, ela mesma prepara com a
mãe o funeral, a "festa de núpcias", como costumava dizer. E explica
como confeccionar a roupa; escolhe as músicas, as flores, os cantos e as
leituras: "Enquanto você estiver me preparando, mamãe, deverá repetir:
agora Chiara Luce está vendo Jesus".
"As
expressões desse seu último período, segundo Maria Grazia Magrini,
responsável pela coleta do material sobre Chiara Luce para o "processo
de beatificação" – se parecem muito com as de Teresinha do Menino
Jesus". E lembra uma das últimas frases da santa: "É preciso saber morrer de alfinetadas antes de morrer por golpes de espada".
Domingo,
7 de outubro de 1990, 4h. O momento do encontro com o seu "esposo". Ao
seu lado estão o pai e a mãe. Do lado de fora da porta, os amigos. Clima
de paz e quase de naturalidade. Suas últimas palavras são dirigidas à
mãe: "Tchau. Esteja feliz porque eu estou feliz".
Duas
mil pessoas participam do funeral. Fala-se de paraíso, de alegria, de
escolha radical de Deus, segundo o exemplo de Chiara Luce. Na homilia, o
bispo diz: "Eis o fruto da família cristã, de uma comunidade de
cristãos, o resultado de um Movimento que vive o amor recíproco e tem
Jesus em meio".
Os
efeitos da sua experiência continuam após a sua morte, naqueles que
dela tomam conhecimento, pois sentem-se impulsionados a viver com
radicalidade o Evangelho, e a escolher Deus como tudo. É uma "santidade"
contagiosa.
A
fama de Chiara Luce se difunde, lentamente mas decididamente. Por
iniciativa do bispo ela é declarada "serva de Deus". Agora o processo de
beatificação prossegue no Vaticano.
"Sejam uma geração de santos"
A este ponto é espontâneo perguntar: quem é santo nos dias de hoje? Certamente, só Deus é santo. Mas nas Escrituras lê-se: "Sejam santos, porque eu sou santo". Nos Atos dos Apóstolos, os cristãos são chamados simplesmente de "santos". Santo é aquele que reflete a única santidade, a de Deus, manifestando virtudes provadas, caridade sem limites, confiança total em Deus. Então, Chiara Luce parece ser assim.
Um último aspecto deve ser enfim colocado em relevo. O Cardeal Martini escreve: "A santidade acontece em cachos, não é somente um grão, mas o seu conjunto que se torna fermento, sal da terra, luz do mundo". Chiara Lubich desde o nascimento dos gen, quis popror aos jovens do Movimento um projeto elevado: "Sejam uma geração de santos". Pois
bem, Chiara Luce não está só, porque outros numerosos jovens do
Movimento dos Focolares morreram com as mesmas disposições que ela.
Beatificação de Chiara Luce Badano
Setembro de 2010